A Entrega Humana à Terapia CranioSacral
Mesmo nestes tempos de grandes avanços na comunicação, onde algumas pessoas se tornam famosas com base em poucos méritos, existem grandes homens e mulheres dedicados inteiramente à filantropia, pessoas que preferem ser lembradas não por elas mesmas, senão pelo legado que deixam para a humanidade.
Em parte por timidez e em parte porque sabem que sua verdadeira fortuna é o conhecimento que adquiriram com o seu trabalho, vivem cada dia redescobrindo e se maravilhando com a complexidade do ser humano.
Sem menosprezar os outros, gostaria de falar sobre o Dr. John E. Upledger. Muitos de vocês o conheceram por seus livros e pela criação da Terapia CranioSacral e da Liberação SomatoEmocional.
Em seu livro “Seu Médico Interno e Você” ele relata a sua vida: formado em Medicina, criou sua família e realizava o seu trabalho com uma natural entrega. Um dia o destino, ou o acaso, o fez enfrentar um caso que não se ajustava a nenhum dos quadros clínicos descritos nos livros. O paciente em questão apresentava com sintomas graves em seu sistema nervoso, seu aparelho locomotor e alterações cutâneas. Depois de muitas buscas e vários tratamentos localizaram uma calcificação no seu tubo dural (que envolve a medula espinhal), a nível cervical. Decidiram raspar a calcificação cirurgicamente e foi durante esta intervenção que Dr. John Upledger sentiu em suas mãos como este tubo, que envolve a medula espinhal, se movia com uma cadência rítmica, independente dos ritmos cardíaco ou respiratório.
A partir deste momento decisivo, a sua vida mudou drasticamente; não se deteria enquanto não encontrasse uma explicação para este novo ritmo corporal que, mais tarde, chamaria de Ritmo Craniossacral.
Ele absorveu todos os conhecimentos osteopáticos até então conhecidos. Estudando a obra de William Garner Sutherland sobre a mobilidade dos ossos cranianos, se propôs a formar um grupo de investigação na Universidade de Michigan para comprovar ou não esta mobilidade e a sua relação com o ritmo craniossacral.
Trabalhando com crânios “frescos” de humanos e primatas demonstraram que os ossos craniais nunca se fundem totalmente, e devido a flutuações do volume de líquido encefalo-raquidiano dentro do sistema de membranas meníngeas, se moviam num ritmo que oscila de 6 a 12 vezes por minuto. E mais, este ritmo craniossacral era perceptível não só no crânio, como em qualquer parte do corpo, através do tecido fascial corporal.
Dr. John Upledger se sentiu fascinado de como a natureza nunca deixa de nos surpreender por sua complexidade, e, às vezes, por sua simplicidade; às vezes basta escutar que a informação nos chega, e ele soube escutar.
Ele sabia que este trabalho não terminava ali, tinha que ter um sentido, uma aplicação, e assim foi-se desenvolvendo a Terapia CranioSacral, um método de trabalho tão gentil e sutil que até surpreende que possa provocar mudanças tão espetaculares na saúde dos pacientes.
A sua frase “A distância mais curta entre dois pontos é a intenção” define parte de sua filosofia: ajude o corpo, seja um simples assistente incondicional, o corpo já sabe o que tem que fazer, porém precisa deste apoio suave e certeiro.
Dia a dia, Dr. Upledger comprovava a melhoria dos seus pacientes, e assim foi criando técnicas específicas de tratamento, mas mais do que para seu uso pessoal, foi para transmiti-las ao resto do mundo: para que fossem fáceis de aprender por todo profissional realmente interessado na saúde e no ser humano integral.
Não terminou aí; trabalhar com as membranas meníngeas e as fáscias em geral nem sempre resolvia totalmente o problema do paciente. Dr. Upledger começou a investigar o que ele chamou de “Cisto Energético”: energias residuais pós-traumáticas que o corpo não consegue dissipar e que então encapsula. Se o cisto de energia guarda uma emoção desagradável, não basta tratar somente a parte física, é preciso liberar a emoção que está freando o processo.
Chegamos à técnica de Liberação SomatoEmocional, onde se integram corpo, mente e alma. Quantas vezes a medicina tem esquecido que somos mais do que reações químicas e células, temos emoções e pensamentos, temos sentimentos e tudo é parte do ser humano. Um trauma emocional pode nos deixar mais marcado do que a pior queimadura. Porém podemos ajudar a livrar-nos desta bagagem, sempre respeitando o processo natural do paciente, sem terapias muito complicadas nem sofrimento desnecessário, escutando o corpo que carrega a bagagem.
Atualmente, Dr. John tem mais de 70 anos de idade e continua trabalhando na sua clínica (o Upledger Institute na Flórida-EUA), dedicando parte do seu tempo a programas com crianças autistas, veteranos de guerra e terapia com golfinhos.
A sua mente aberta não conhece limites; além dos cursos de Terapia CranioSacral e Liberação SomatoEmocional, lidera seminários sobre o sistema imunológico e a sua relação com câncer e transplantes. Ele se dá ao luxo de trabalhar mesmo com células, pois tudo que está vivo tem memória e capacidade de resposta.
Dr. John E. Upledger é um homem sem medo do que dizem dele, um homem que derrubou suas barreiras mentais, para quem tudo é possível em se acreditando. Vendo-o em pessoa com seu chapéu de caubói e sapatos de tênis, com o olho vivo embora cansado, custa acreditar que dedicou a sua vida para que o ser humano sofra menos e transmitir o que sabe para quem tem ouvidos para escutar. O mundo precisa de mais gente assim.
Virginia Peralta Sánchez
Instrutora Certificada do Upledger Institute Espanha.
Publicado na Revista Masaje- Fevereiro 2002.